O Rio de Janeiro da Olimpíada esportiva definitivamente não é o Rio
da olimpíada do conhecimento – no caso, a Olimpíada Brasileira de
Astronomia e Astronáutica. A opinião é do professor João Batista Garcia
Canalle, 57, presidente do Instituto de Física da Uerj (Universidade do
Estado do Rio de Janeiro). Há 19 anos coordenador da olimpíada que
reúne alunos de pelo menos 10 mil escolas públicas e privadas de todo o
país, ele disse ser "frustrante" acompanhar o volume bilionário de
recursos destinados às obras ao megaevento esportivo, quando, no
instituto, o corte de recursos federais contingencia desde as medalhas
do evento científico até as viagens para eventos do tipo nos quais
alunos representarão o Brasil no exterior.
De acordo com o
professor, uma vaquinha tenta aglutinar recursos para as medalhas de 50
mil alunos –dentre os 800 mil participantes do torneio. Segundo ele, é
a primeira vez que o evento corre o risco de não ter esse tipo de
premiação – já que dos R$ 1,2 milhão esperados do CNPq (órgão do
governo federal de fomento à pesquisa), este ano, veio pouco menos da
metade.
"As medalhas são fundamentais para a motivação dos
alunos. Quem não gosta desse reconhecimento? Até os atletas que vêm do
mundo inteiro para os Jogos Olímpicos querem medalhas", afirmou
Canalle. Ele completou: "Este ano, com a crise econômica e a corrupção
em escala astronômica, recebemos menos da metade do dinheiro disponível
e tivemos que fazer um monte de cortes", relatou.
De acordo com
o professor, outras ações bancadas com a verba federal e que precisaram
passar pelo contingenciamento afetarão estudantes que vão representar o
Brasil em outras olimpíadas de astronomia – em outubro, no torneio
latinoamericano na Argentina, e em dezembro, na Índia.
"Temos
cinco alunos e dois professores que irão para o torneio na Índia. Eles
estão rateando toda a despesa com passagem, roupas e outras despesas de
viagem porque não tivemos recurso para bancar isso, como em anos
anteriores. No evento da Argentina, a mesma coisa – e também com cinco
alunos. Como a maioria deles é de escola particular, as famílias estão
dando um jeito para pagar essas despesas, mas temos alunos de
institutos federais, por exemplo, que eram suplentes na disputa e
desistiram de ir porque não tinham condições financeiras de fazer esse
rateio", lamentou o professor. "Para as nossas olimpíadas, para se ter
uma ideia, não tivemos sequer como imprimir os cartazes que
costumávamos enviar para as escolas; não mandamos correspondências, o
que fizemos, foi pela internet. Mas as escolas rurais, onde o sinal nem
sempre é bom, acabam sendo prejudicadas com isso", admitiu.
Indagado sobre a sensação de passar pelo que considera a pior situação
financeira do evento justamente no ano em que o país é sede de Jogos
Olímpicos, Canalle foi taxativo: "É muito frustrante, porque a gente
percebe claramente que o dinheiro para pagar todas essas obras
faraônicas que estamos vendo agora saiu de áreas essenciais como a
educação – não fosse assim, e a Uerj, onde dou aula, por exemplo, não
estaria nessa situação financeira absurda em que está, com atraso de
salários de funcionários e de pagamento de fornecedores", criticou.
O que ele espera do futuro da Olimpíada Brasileira de Astronomia e
Astronáutica? "Sou otimista – a gente não pode desistir. Este pode ser
um período muito ruim no Brasil, mas acredito que as coisas vão
melhorar. Eu quero ver aluno, e não bandido, ser destaque nas primeiras
páginas dos jornais; é para isso que nos empenhamos."
A
vaquinha está
disponível para qualquer pessoa doar. Ao todo, para confecção de 50 mil
medalhas – divididas em ouro, prata e bronze – , a um custo aproximado
de R$ 3 a unidade, seriam necessários pelo menos R$ 150 mil. Os
organizadores arrecadaram até esta terça-feira pouco mais de R$ 20 mil,
mas têm ainda até outubro para atingir a meta.
"Equipe brasileira na Olimpíada Internacional de Astronomia
e Astrofísica de 2014"
Medalhista em 2011 passou em cinco universidades nos EUA
Medalhista na Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica em
2011, o estudante André Lucas Buriti de Melo, 21, avaliou que o evento
foi "certamente" um dos fatores que possibilitaram a
admissão dele em cinco universidades de ponta nos EUA,
em 2014. "Em todos os sentidos: tanto a parte de inspiração (já que foi
nesse evento de premiação, Jornada Espacial, que pela primeira vez me
dei conta de que, talvez, estudar fora fosse possível pra mim), quanto
na parte prática, porque foi nesse evento que conheci a Fundação
Estudar - organização que me orientou e contribuiu enormemente para
minhas admissões no exterior", disse.
Na avaliação do jovem,
participar de olimpíadas do conhecimento ajudou tanto a formular um
pensamento crítico e a pensar em soluções criativas para os problemas,
como a trabalhar em equipe. Sobre a crise atual, o estudante disse
esperar que isso não afete de fato a olimpíada, uma vez que, defendeu,
elas são ferramentas que promovem integração entre estudantes com
experiências diferentes.
"Eu, como estudante da rede estadual
do Acre, tive a oportunidade de conhecer estudantes das melhores
escolas privadas da América do Sul por meio da Olimpíada de Astronomia.
É uma oportunidade fantástica de expandir a perspectiva sobre a
educação no país", relatou.
FONTE:
http://educacao.uol.com.br/noticias/2016/08/02/sem-verba-para-medalha-a-evento-cientifico-professor-lamenta-frustrante.htm